Poema em Forma de Manual de Instruções para Corações sem Dono
Nasci com a alma em contramão,
e no país das certezas já fui contrabandista.
Já troquei relógios por luas,
empregos por noites mal dormidas
e promessas por corpos nus.
Já amei como quem foge —
não por medo, mas por respeito à liberdade.
Porque o amor, quando prende,
é só uma gaiola com vista para o mar.
O poeta, um tal bêbedo de almas,
dizia que o amor é um fingimento sincero,
mas o outro, com voz rouca de vinil riscado,
ri e pede outra rodada dizendo:
“El amor, mi amigo, no se explica, se brinda”.
E brindei.
Brindei com mulheres de riso fácil ou cansado,
com amigos que só aparecem quando a garrafa está cheia,
com os silêncios que me acordam
quando os gritos se calam.
Amei em camas por fazer
e em versos mal acabados.
Fui feliz por breves instantes —
que é o único tipo de felicidade que não mente.
E se um dia perguntarem por mim,
diz-lhes que fui por aí:
a escrever poemas em guardanapos sujos,
a amar como quem perde o comboio
e mesmo assim sorri.
Porque o amor não é ter — é não impedir!
A liberdade não é porta — é caminho!
E o prazer de viver?
É saber que tudo acaba…
e mesmo assim querer o início.
E no fim de todas as fugas,
é ela —
essa mulher que me sabe inteiro —
que me acompanha sem me prender,
que me ama sem me deter,
e faz da minha vida errante
um lugar onde, enfim,
vale a pena viver.
Paulo Brites
Julho/2025
Faro - Algarve - Poemas
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