Três dias na Viagem de uns Viajantes Solitários
No silêncio de uma estrada sem fim,
cruzou-se o meu olhar com o teu, sem querer,
eu, fotógrafo do instante, tu, pintora do ser,
e ali, na solidão da viagem, nasceu algo que se fez crescer.
Tu olhavas o mundo com cores que eu não via,
eu capturava sombras que escapavam ao teu pincel,
e entre nós, como uma brisa, surgia,
uma poesia muda, feita de luz e papel.
Foi num gesto — o teu pincel no ar,
a minha câmara pronta a disparar —
foi um instante breve, sem nada prometer,
de quem vê no outro o que não se consegue ver.
E assim, sem falas, pintámos juntos o momento,
eu com a luz roubada à paisagem, tu com o traço ao céu,
nesse olhar encontramos o que sempre foi véu,
e nessa troca, fez-se amor, como se fosse um juramento.
Repara na minha poesia, vazia de tudo,
mas cheia de lembranças que o tempo não levou,
elas guardam o amor, o que vi e não sou,
a memória de um beijo que no silêncio se fundou.
Viajar, tal como disseste, é como amar —
é partir sem nunca sair, é chegar sem saber voltar,
é viver o mundo inteiro sem nos abandonar.
A vida é a estrada e a alma, o seu navegar.
Nada mais ficou para além de uma poesia leve,
feita de cores que o vento desfez no caminho,
tu na tua arte, eu perdido no meu destino,
e seguimos, cada um no seu mundo breve.
Paulo Brites
Out/2024
Ascoli Piceno - Itália - Poemas - Paulo Brites
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