A gaveta do poeta não tem fundo

 
A gaveta do poeta não tem fundo

A gaveta do poeta não tem fundo

A gaveta do poeta não tem fundo
Tem lá tudo o que não quer
e aquilo que há-de ser:
os alinhavos do mundo

Tem postais de mil locais
e um resto de maçã
Há sempre num canto qualquer
logo depois de amanhã
um retrato de mulher

Tem o caos lá de guarida
e um papel vacinado
tem o mar todo entornado
e uma estrela de semente
Tem num saco lacrimal
a caneta preferida
com a dor da sua gente

E tem a casa deserta
o palhaço o avião
e um sorriso tão antigo
que escondeu da multidão
Tem o medo o embaraço
até o sonho tem espaço
Só não tem medida certa 
nem barco de salvação

É por isso que a gaveta do poeta
não tem fundo e está aberta 
porque não tem hora certa
para sair o coração


João Monge – A gaveta do Poeta



Enviar um comentário

0 Comentários